Testemunhos

Natureza e peregrinação


O padre José Antunes da Silva é missionário do Verbo Divino, um apaixonado pelas peregrinações e profundo conhecedor do Caminho de Santiago. Em entrevista à Agência ECCLESIA dá a perceber o encantamento de caminhar entre a Natureza e de como este tempo quaresmal também pode ser uma peregrinação.




O padre José Antunes da Silva é missionário do Verbo Divino, um apaixonado pelas peregrinações e profundo conhecedor do Caminho de Santiago. Começou com um grupo de universitários a caminhar para se distanciar dos ruídos da cidade e nunca mais parou…
Em entrevista à Agência ECCLESIA dá a perceber o encantamento de caminhar entre a Natureza e de como este tempo quaresmal também pode ser uma peregrinação com subidas e descidas, pontes e riachos, sol ou chuva…

Agência ECCLESIA – Fazer uma peregrinação nasceu de algum sonho? E porque é que a primeira foi a Santiago de Compostela?
José Antunes Silva – Eu sempre gostei de andar a pé no meio da Natureza… e Santiago dada a proximidade e o local que é, como um centro que ao longo dos séculos atraiu peregrinos de todo o Mundo pela a existência do túmulo do apóstolo Tiago. Além disso a distância permitiu que fossem peregrinações com um número razoável de dias que permitiam entrar num ritmo mais calmo, de contacto com a natureza que é muito libertador para quem vive o ano todo no meio do trabalho, do stress e do ruído da cidade.

AE – O peregrino tem sempre em vista uma meta. Pode-se dizer que essa meta é o encontro com Deus?
JAS – A peregrinação tem sempre uma meta… Se é esse encontro, já não sei responder ao certo… O que posso dizer é que através da peregrinação, das etapas que fazem, podemos encontrar Deus de alguma forma… esse encontro faz-se ao longo do caminho, vai-se descobrindo porque não se dá num único momento. Deus vai-se revelando no próprio caminho, etapa a etapa.

AE – A Natureza é a maior companhia numa peregrinação, nomeadamente no caminho de Santiago são variados os elementos que se apresentam: bosque, pontes, regatos… Que significado tem toda esta envolvente?
JAS – Quem anda a pé muitos dias atravessa paisagens diferentes e o contacto com a natureza pode ser uma extraordinária experiência espiritual no sentido de nos sentirmos um todo. Como dizemos num salmo “Deus criou o Mundo e tudo o que nele contém” portanto toda a criação é obra de Deus… Eu costumava pensar assim: estes montes, estas florestas, estes riachos estão aqui desde o início do Mundo para mim, para eu contemplar, para eu cruzar… Toda a beleza que Deus criou no universo está ali na actualidade para mim, mas é necessário eu abrir os olhos, o coração e a minha vida para observar, só assim me consigo sentir criatura de Deus.

AE – Referia que uma peregrinação é uma rica experiência espiritual. Cada vez que o faz é sempre um novo convite à oração e contemplação?
JAS – Sim… Eu gostava de fazer uma distinção: mais do que fazer coisas religiosas ou espirituais numa peregrinação é importante viver a espiritualidade de peregrinar, porque eu não preciso de ir em peregrinação para rezar! Agora viver um caminho, as várias etapas, durante dias, isso só mesmo colocando pés ao caminho. Etapa por etapa, sem querer chegar à meta no primeiro dia, fazendo sempre o processo e durante esse tempo perceber as forças, as fragilidades e pelo caminho conhecer outras pessoas, saber acolhê-las e confrontar ideias e ideais. Muitas vezes mesmo repensar a nossa fé, as nossas razões de acreditar com essas pessoas, também peregrinos e o contacto com a natureza é que nos leva à proximidade com o divino.

AE – No meio da natureza, em peregrinação, o que costuma pensar ou rezar?

JAS – No silêncio… Caminhando muito tempo, muitos dias, através de paisagens praticamente desertas muitas delas, onde só o silêncio habita, isso também vai entrando em nós. Uma das coisas que mais estimo neste ambiente de peregrinação é a terapia do silêncio, porque estamos cheios de ruídos dentro de nós e uma caminhada longa é terapia. Não é preciso muitas palavras, nem muitas orações, porque se conseguirmos fazer silêncio dentro de nós, então iremos ouvir muitas coisas: a nossa consciência, o nosso coração e especialmente os mais variados sons da natureza. E depois a voz de Deus.
Silêncio poderia ser a melhor palavra para eu definir a peregrinação, o atravessar os campos, as montanhas, os bosques.

AE – Aqueles que vivem na cidade têm falta de proximidade com a Natureza e por isso se encantam tanto numa peregrinação?
JAS – Sim, acho que há uma espécie de saudade de pertencermos à terra e quem vive nas grandes cidades, no meio do ruído e com pouca possibilidade de acompanhar o ciclo das estações do ano e tem necessidade de sair, nem que seja numa breve caminhada de 5 ou 6 dias. Torna-se num deslumbramento que as árvores têm folhas e que depois as perdem para dar flores e frutos, chega a dar-nos uma nova visão da vida, porque este processo é lento e nós queremos tudo rapidamente.
Nesta altura, por exemplo, fora da cidade temos a oportunidade de assistir ao nascimento da Primavera que está agora a explodir em cores, em flores e folhas e numa peregrinação a pé permite sentirmos a cumplicidade de pisar a terra, passo a passo, de sentirmos o vento ou de nos molharmos com a chuva… experiências que nos ajudam a perceber o nosso lugar no Universo e o papel do Criador.

AE –Este tempo de Quaresma também pode ser definido como uma peregrinação?
JAS – Sim, a Quaresma é uma peregrinação, são 40 dias. Eu costumo mesmo dizer que é uma peregrinação das cinzas à luz e também exige de nós vencer etapa após etapa, não se pode chegar à Páscoa no dia a seguir a quarta-feira de cinzas. É preciso haver um processo de crescimento que envolve algum sacrifício, alguma austeridade, que envolve o jejum, a oração… Toda uma série de etapas que nos vão ajudar a transformar a cinza, que simboliza a nossa fragilidade, o nosso pecado, em luz, a luz Pascal que é o próprio Cristo. Quarenta dias até lá é mesmo uma caminhada, não é física mas também pode envolver alguma peregrinação neste tempo. A própria quaresma é um caminho espiritual que exige dedicação e empenho para que haja também alguma mudança.

AE - Comparando com as peregrinações por que tipo de natureza temos de passar para ir das cinzas até à luz?
JAS – Primeiro é preciso o discernimento, o essencial do supérfluo. Para peregrinar a primeira coisa é fazer a mochila e esse acto é de discernir o que levar e o que deixar em casa. É talvez nesta caminhada quaresmal uma primeira atitude a ter, ficando com essencial, a palavra de deus e o amor ao próximo, na esmola, oração e jejum aliados no amor a Deus e ao próximo.
Depois a persistência, se eu quero atingir uma meta eu não posso desistir ao primeiro fracasso nem saltar etapas. Este passo também é importante numa caminhada quaresmal porque pela constância também conseguimos dar espaço a Deus.
Como pontes ou riachos… como momentos de beleza na quaresma temos o perdão, dar e receber o perdão podem ser momentos de extrema beleza na nossa vida espiritual. Outro é a caridade e solidariedade, traduzida na esmola em linguagem antiga, o ser capaz de amar o outro, de o ajudar sem esperar nada em troca. Isto também se pode aprender numa peregrinação, a ajuda que se dá ao outro, que é peregrino como eu, só pelo facto de ajudar. Um apoio, um abrigo, um pão ou uma simples conversa são gestos que se fazem sem esperar nada em troca, são momentos de grande beleza.

AE – Antes de começar uma peregrinação decerto que dá algumas palavras. O que nos diria antes desta caminhada quaresmal?
JAS – A importância do silêncio interior, o olhar para quem vive connosco e à nossa volta não podem ser esquecidos. É através deles, dos outros, que podemos chegar ao coração de Deus.





Missão Jovem 2010 - Testemunho







Chamo-me Rita, tenho 20 anos, sou do Alentejo, concretamente de Portalegre, terra por sinal bem acolhedora. Estudo em Coimbra, no curso de Gerontologia Social. Tive o prazer de conhecer durante este ano lectivo a minha colega Ana Tomé, que pertence ao grupo de jovens do Retaxo - Caminhantes da Paz - . Através dela surgiu o convite para participar no Encontro Missão Jovem 2010.
Sempre gostei de ser bastante participativa a nível de dinamismos sociais principalmente naqueles que nos transmitem paz interior e permitem uma partilha de sentimentos saudáveis para construirmos uma vida plena, praticando o bem para com o próximo.
Durante 10 anos fiz parte do Agrupamento 103 de Escuteiros de Portugal, de Portalegre. Actuávamos na comunidade, como “mini-missionários”, porque todas as nossas actividades eram missões, para que se pudesse partilhar amor, amizade, carinho, paz, solidariedade e reciprocidade na comunidade ou para que tais valores se restabelecessem na mesma. Como tal senti-me disposta a participar na missão Jovem 2010.
Apesar de a actividade começar apenas no sábado, o nosso grupo, chegou na sexta-feira. Fomos recebidos como se fossemos da casa, abriram-nos as portas e acolheram-nos muito bem, o que me fez sentir muito à-vontade juntamente com a boa disposição e abertura do grupo.


No dia seguinte começaram as actividades, conhecemos os grupos, montamos as tendas, e muitos dos grupos trabalharam em parceria ajudando-se. Depois tivemos a cerimónia de abertura onde a música era a forma mais fácil de comunicarmos abertamente entre todos o que possibilitou a interacção.
De entre as actividades quero salientar, porque gostei muito, as missões nas paróquias, onde conhecemos um pouco mais da história de missionários das mesmas e dos vários grupos de solidariedade, na comunidade. Houve um enorme cuidado nas refeições, estava tudo bastante organizado e nunca faltou nada.
O testemunho antes do jantar, foi uma prova viva de como apesar de todas as dificuldades “crer é poder”: todos podemos prosseguir os nossos sonhos e vontades, conhecendo as nossas limitações e sabendo-nos adaptar, de forma adequada, á vida através delas. Aceitando quem somos. 


Os concertos foram magníficos cheios de alegria, boa-disposição e a vigília nocturna fez nos reflectir sobre o sentido da vida e transmitiu-nos um conforto interior gratificante.
No último dia, domingo, de manhã, pudemos escolher o workshop que queríamos frequentar. A Eucaristia, no final do dia, permitiu a cada grupo de cada workshop transmitir a mensagem recebida. Deste modo pudemos partilhar a mensagem entre todos, o que nos aproximou mais uns dos outros.
Pessoalmente, apreciei muito o workshop que frequentei, “Cuidados paliativos”. A mensagem deste grupo foi simples, mas real: Todos somos como uma folha de uma árvore. Ao cairmos, porque nos encontramos debilitados no final de uma vida, merecemos carinho e conforto, merecemos ser tratados como pessoas, com sentimentos e não como um número de vários indivíduos de uma sociedade, os quais se encontram doentes ou em final de vida.
Antes da partida ainda pudemos desfrutar de uma pequena recordação com um pequeno filme onde “imagens valem mais do que mil palavras”.
Foi um óptimo fim-de-semana. Ao regressar a casa pensei no quanto de bom podemos transmitir ao nosso próximo apenas com um gesto e, no importante que é, vivermos o amor e a fé. Cheguei à conclusão que pertence a cada um de nós a escolha do caminho certo.
Reflecti também como, no dia-a-dia no meu quotidiano, posso ser missionária, transmitindo amor e ajuda, em pequenos actos. De facto, todos, de uma maneira ou de outra, acabamos por ser missionários: basta agir com honestidade e abrir o coração. 






Obrigado Missão Jovem, pelos momentos que vivi e por me teres, mais uma vez, reavivado da minha fé. Uma vez mais ela foi posta á prova e senti-me reconfortada. Cresci como pessoa, a nível individual e social, mas sobretudo a nível interior, pois ganhei força para continuar a enfrentar todos os meus obstáculos.
Conheci pessoas que me transmitiram um enorme conforto e carinho. Nunca as irei esquecer porque a sua amabilidade foi pura e permitiu-me viver bons momentos. Estou ansiosa pelo próximo Missão Jovem 2011!
Ana Rita Trindade








ESPIRITANAS E ESPIRITANOS NO NORTE DE MOÇAMBIQUE
Missão no coração do povo Macua

A Alice, a Rosenir, a Adelaide, a Augusta, a Joyce, o Damasceno, o Raul e o Elson têm duas coisas em comum: são membros da grande família Espiritana e vivem em Itoculo, Diocese de Nacala, província de Nampula. Mas não estão só nesta missão difícil: partilham-na com dezenas de Leigos comprometidos com as suas Comunidades. A pobreza é muita, mas a vontade de construir futuro é bem maior. Foi lá neste extremo norte de Moçambique que vivi a minha Páscoa 2010.
Moçambique surgiu como apelo missionário em 1996 para os Espiritanas. As irmãs chegaram em 2005, lançaram em 2009 o Centro Nutricional e acabam de inaugurar o Lar ‘Eugénie Caps’ que acolhe 50 meninas das aldeias que terão acesso a uma formação integral e à Escola Oficial. Foi em Itoculo que passei a Páscoa e participei na Bênção do Lar, presidida pelo Bispo de Nacala, D, Germano Grachane.


Espiritanos em Nacala

Itoculo foi vila importante no tempo colonial. A guerra passou por ali e deixou um rasto de destruição, lançando o povo na mais terrível das misérias. Hoje, o centro parece ainda uma vila fantasma, com muitas casas destruídas, embora tenha sido uma das localidades escolhidas para ‘vila do milénio’, com apoio do Japão.
Os Espiritanos chegaram a Nacala em 1996, recuperando a Missão de Netia. Em 2004 inauguraram a nova Missão de Itoculo, com a responsabilidade de 77 Comunidades espalhadas por uma vastíssima área. Dividiram-na em três Regiões e em 15 zonas pastorais. Seguindo o estilo próprio da Igreja moçambicana, a organização é ‘ministerial’, na medida em que todas as comunidades estão preparadas para ‘sobreviver’ sozinhas, garantindo o essencial da vida cristã com os seus próprios dão um apoio precioso aos Padres na dinamização desta grande paróquia missionária. Os diversos membros das Comunidades respondem pela liturgia, jovens, família, acção social, direitos humanos, saúde, educação, catequese, ecumenismo e diálogo inter-religioso. As Irmãs Espiritanas, desde 2005, são um precioso apoio aos Padres na Pastoral integral.


Formar os ‘ministros’

Os Padres e as Irmãs apostam sobretudo na formação dos líderes destes ‘ministérios’, visitando as comunidades e acolhendo-os no Centro Pastoral S. Francisco Xavier que foi construído em Itoculo. Lá se ministram cursos de 15 dias, uma semana ou um fim se semana para capacitar os líderes. As celebrações da Eucaristia e dos outros Sacramentos fazem-se em diversas capelas da vasta extensão da Paróquia / Missão, ou, muitas vezes, debaixo de mangueiras e cajueiros.


Pastoral integral

Ao olhar para o Plano de Pastoral da Paróquia, é impressionante ver o itinerário que pretende percorrer em 2010, com muitas acções a implementar. Estão previstas acções de formação para o Conselho Paroquial, os Anciãos das Comunidades, os Jovens, a Catequese, as Famílias, os Animadores Vocacionais, a Infância Missionária, a Justiça e Paz, as Escolas Comunitárias, a Ajuda Fraterna, as Mamãs, a Saúde, o Ecumenismo, a Comunicação Social, o Grupo Coral. É um Plano de Pastoral ousado numa área de acessos difíceis e onde as populações vivem numa pobreza confrangedora aos olhos de qualquer europeu que por lá passe. É uma Missão à prova da fé e da esperança.

Espiritanas de 3 Continentes

Olhemos para o perfil das Irmãs. A Irmã Alice Areia tem 72 anos e um vastíssimo curriculum missionário e humanitário. Natural de Esposende, é enfermeira e já trabalhara antes em Cabo Verde, no Senegal e em Portugal (foi Superiora Provincial). É o rosto mais emblemático desta nova Missão que viu nascer, ajudou a crescer e vai agora confiar nas mãos de outras Irmãs. A Irmã Adelaide Teixeira, 52 anos, é natural de Cabo Verde. Trabalhou vários anos em Portugal, formou-se como Animadora Sócio-Cultural e Assistente Familiar. Está em Itoculo desde 2006.
A Irmã Augusta Vilas Boas é de Barcelos. Formada em Enfermagem, com 42 anos, trabalhou alguns anos no interior pobre da Guiné-Bissau, sendo nomeada em 2006 para Itoculo, onde trabalha no hospital e dirige o Centro de Nutrição, fundado pelas irmãs Espiritanas com o apoio da Aparf.
A Irmã Joyce Abi é nigeriana, tem 37 anos, estudou na Nigéria e em Portugal, formando-se em Saúde Comunitária. Está em Itoculo desde 2006.
A Irmã Rosenir Soares nasceu em Minas Gerais (Brasil) há 45 anos. Especializou-se em Serviço Social, sobretudo no acompanhamento a jovens delinquentes. Trabalhou já no Brasil, nos Camarões, no Senegal e na França, sendo enviada a Itoculo em 2009 para ser a nova Superiora da Comunidade e Directora do Internato.

Garantir mais Saúde

Acompanhei a Irmã Augusta na visita ao hospital. São algumas casas pequenas onde se pretende fazer um pouco de tudo o que é simples: consultas, partos, pequenos tratamentos. Sem possibilidade de fazer raio x ou exames, longe de qualquer cirurgia (alias, só vem o médico uma vez por semana, todo o serviço é assegurado por enfermeiros), a Saúde ainda tem muito caminho a fazer para responder às necessidades das populações. Por isso, os índices de morte por malária são altos, encontram-se muitas crianças órfãs, a mortalidade infantil também atinge percentagens muito elevadas. Uma equipa móvel percorre as aldeias do interior para vacinação e alguma formação, uma vez por mês, em quatro Centros. A incidência de HIV /Sida também é preocupante.
Pobre e abandonado, o interior norte de Moçambique tem épocas de fome ou desnutrição grave. Por isso, com o apoio da APARF, as Irmãs Espiritanas construíram e dirigem o Centro Nutricional ‘Crescer na Esperança’, inaugurado a 24 de Junho de 2009. Apoia 110 crianças, cada qual com a sua história bem sofrida. Ao ver as fichas, aparecem dados como ‘órfão’ ou ‘abandonada pela família’.


Educação no feminino

Foi na manhã de 6 de Abril. O Internato Feminino foi solenemente benzido e inaugurado. D. Germano Grachane chegou de Nacala para presidir ao acontecimento que juntou os Padres, as Irmãs, as Autoridades Locais, Sol Sem Fronteiras, os responsáveis máximos pela Comunidade Católica, as famílias de algumas das Meninas que farão deste Lar a sua nova Casa durante o ano Lectivo. Este projecto das Espiritanas pretende garantir a Escolaridade a 50 Meninas que virão das 77 Aldeias que pertencem á Missão de Itoculo. É um projecto de Sol Sem Fronteiras com co-financiamento do Governo Português (IPAD).
Depois de um momento de oração, D. Germano salientou a importância do Projecto, os Missionários falaram da aposta na Educação como chave da Missão e do Desenvolvimento, as Autoridades Locais, uma a uma, elogiaram o papel importante que a Missão Católica ali desempenha ao serviço das populações, sobretudo das pessoas e famílias mais pobres. Benzida a casa, espaço a espaço, a Irmã Rosenir, Directora, explicou cada um dos compartimentos, dando-se relevo especial à sala de estudo e biblioteca, com o nome de ‘David Piteira Santos’, cuja família é grande benfeitora da obra. Tudo se concluiu com um almoço. Seis meninas vivem já neste Lar que quer honrar o nome do projecto: ‘Educação na Esperança’.

Tony Neves,
Em Itoculo – Nacala


Nota: Na 1ª Jornada Diocesana Missionária, o P. Tony Neves, colaborou connosco na sua preparação, participou e dinamizou, com os Jovens sem Fronteiras (JSF), esse dia e incentivou-nos a criar um espaço, aberto e actual, usando os novos meios de comunicação, para que a Missão chegasse ao longe e ao largo.
Ao darmos a boa nova do nascimento da Página do Secretariado, o P. Tony, respondeu de pronto e enviou-nos o testemunho da sua experiência, em Moçambique. Obrigado, P. Tony Neves








Consagrado e Missionário hoje
O título é pertinente, hoje mais do que nunca. Desafia-me a entrar no fundamental e existencial da vocação consagrada e missionária. Só há um caminho de abordagem: o existencial.
Na impossibilidade de tocar todos os aspectos, vou cingir-me a 4, mais visíveis a todos, seja religiosos como cristãos que convivem de algum modo com consagrados missionários.
Identidade e comunhão
S. Marcos diz-nos que Jesus subiu ao monte e chamou os 12 para estarem com ele e para os enviar a pregar (Mc 3,13-14). A primeira parte do apelo é para “estarem com Ele”. Esta expressão, ou atitude manifesta a intimidade que Jesus de Nazaré quer criar com cada pessoa: conhecer, ver, escutar, entrar na intimidade, percorrer os mesmos caminhos, tomar consciência das opções de Jesus, da sua meta, o sentido da sua vida, o relacionamento com o Pai e com os outros. Aprender vivendo, fazer caminho, tomar opções de vida.
É entrar na intimidade daquele que chama, Jesus de Nazaré. Nesta intimidade a pessoa consagrada liga-se com laços de fraternidade a todos os homens e mulheres a quem o Senhor ama como filhos e redime com a sua morte e ressurreição. Só identificando-me com Jesus de Nazaré posso entrar em comunhão perfeita com os outros meus irmãos.
Em situações de fronteira, os missionários percebem como são débeis. Aí se sente, de maneira especial, que é Deus que tem que nos guiar e proteger. Aí sabemos dar espaço ao espírito que nos indique o caminho a seguir. A nós resta confiar e avançar. A comunidade é vital. É aí que se projectam as actividades, se amparam os confrades, se vive, se reza, se choram as tristezas e se faz a festa.
Anúncio e profecia

S. Paulo escrevia aos cristãos de Corinto: “Ai de mim se não evangelizar” (1Cor 9,16). João Paulo II afirmou em 1991 na Redemptoris Missio (nº 1) que “a missão está ainda bem longe do seu pleno cumprimento”. Jesus chamou os 12 também para os enviar a pregar (Mc 3,14). Este anúncio directo ganha credibilidade no viver com as pessoas, no partilhar a sua sorte, na luta conjunta por melhores condições de vida e maior dignidade humana.
O diálogo cultural e religioso é, sem dúvida hoje, uma forma privilegiada de anúncio do evangelho. O consagrado missionário é chamado a dar “razão da sua esperança a quem lha pedir” (1Pd 3,15), a partilhar com a vida o que, ou quem, a leva a estar ali.
Ao longo da história da igreja os institutos de vida consagrada em geral e os missionários em particular, foram surgindo como vozes proféticas. Ser profeta é ser a voz de Deus na história. A Igreja é o grande sinal que Deus escolheu para profeta e sentinela permanente do seu Reino. A vida consagrada aparece como vocação especial para incarnar este testemunho, iluminando certos aspectos da missão da Igreja. Os consagrados despertam a Igreja para a sua própria vocação: são, como diz Michael Amalados, o pólo profético no interior da Igreja.
Como ser hoje sinais das bem aventuranças do reino, na nova cultura emergente, em ruptura com o evangelho, que perdeu quase todas as mediações culturais por onde passava a nossa imagem: família, escola, a cultura, o meio
…?
Para sermos profetas temos que assentar bem os pés no século XXI, evoluir, mudar, transformar-se. Isso pode ser tremendamente difícil e doloroso na vida cons
agrada e missionária.

Justiça e Paz e Direitos humanos

A sociedade mundial está mais sensível aos problemas humanos, sociais e económicos. Os missionários são confrontados quotidianamente com situações gritantes de injustiça, guerra, violência, descriminação, fome, doenças
… Uma grande parte do seu tempo, está ocupado com estas realidades, que se traduz no concreto em acções de promoção humana, desenvolvimento, educação cívica
Cada dia que passa aumenta o número daqueles para quem a felicidade e um mínimo de condições de vida são
palavras ocas de sentido. Aí, sobretudo em “países de missão”, os missionários são “velas acesas” para irradiar a luz de Cristo a todos os povos e lugares.
Comunhão com a Igreja local

É dos desafios maiores. Ao longo da história, os missionários foram chegando, fundaram comunidades, presidiam a essas comunidades
… porque não havia alternativas. Hoje os tempos mudaram. As Igrejas locais estão organizadas, têm clero, religiosos e religiosas locais; formam agentes pastorais leigos
O trabalho do missionário hoje já não é tanto fundar e dirigir, mas estar ao serviço, ajudar a crescer esta Igreja, a formar agentes pastorais e pastores, a integrar-se nos projectos pastorais das igrejas locais.
Hoje têm mais sentido as palavras de João Baptista: “é necessário que ele cresça e eu diminua”.
Como propor a vocação consagrada?


Aqui está o grande desafio do século XXI á vida consagrada missionária. Eu que trabalho na pastoral vocacional juvenil sinto isto como uma espada que me atravessa o coração. A vida consagrada missionária é uma “desafio de alto risco”. No mundo em que vivemos cada um por si, onde cada um tem tudo, onde a fraternidade tende a desaparecer, onde não preciso de sair de casa para ter tudo; como propor a um jovem uma vida de partilha, de fraternidade, de vida comunitária, de serviço, de dom total da sua vida em situações de guerra de violência de aniquilamento dos direitos humanos fundamentais?
Quem quer correr este risco? E para quê se não há recompensa, se a culpa destas situações é daqueles que supostamente iríamos ajudar (pensamos muitos de nós!)? Que temos nós com isso? E a liberdade religiosa? Para quê anunciar Jesus Cristo se “eles” têm a sua religião e se salvam na mesma?
Só um testemunho honesto e verdadeiro, de vida com Cristo e com os outros, pode ultrapassar todas estas barreiras e cativar alguns jovens. Só a apresentação de um Cristo ressuscitado em ambientes de morte, pode levar ao jovens a responder afirmativamente ao convite que Jesus de Nazaré continua a fazer: “vinde comigo e farei de vós pescadores de homens” (Mc 1,17).

Pe. Leonel Claro, mccj


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In: 


A nova cultura da evangelização implica movimento e comunicação e requer tempo, formação, inteligência, entranhas, mãos e coração.

O I Congresso Missionário Nacional pediu aos bispos um documento-base para servir de orientação à Missão em Portugal. A Carta Pastoral, recentemente publicada, é a resposta que as intervenções de Bento XVI reforçaram e enriqueceram.
São muitas as ideias, as reflexões e os desafios que os bispos nos lançam aos olhos e ao coração. Lembram que já não são os sinos das Igrejas que marcam o ritmo da vida dos Portugueses e que uma simples pastoral de manutenção não garante futuro à Igreja. Dizem os bispos que a Missão parte do coração de cada um para o coração de todos os outros e é a primeira de todas as causas, o primeiro, o maior e o melhor serviço que a Igreja presta à humanidade, ajudando a dar sentido à vida das pessoas. Há ainda uma acentuação na opção e compromisso em favor dos mais pobres. A Igreja local é o sujeito primeiro da missão, mantendo os Institutos bem no centro, apostando na animação missionária como elemento fulcral na pastoral das dioceses e paróquias.
Há ainda a salientar uma proposta concreta: a criação de Centros Missionários Diocesanos e Grupos Missionários Paroquiais. Os centros devem ser os principais propulsores da consciência e do empenho missionário da Igreja Diocesana. Há ainda um incentivo grande dado à missão dos leigos, sobretudo dos voluntários missionários. Os bispos reconhecem que a Igreja perdeu espaço e capacidade de influenciar, pois os valores evangélicos não são muitos considerados, o Evangelho é cada vez menos conhecido e a celebração da Eucaristia e dos outros sacramentos são cada vez menos participados. Por isso, há que anunciar com coragem e vida a boa notícia de um Cristo vencedor de todas as formas de morte. A nova cultura da evangelização é aquela que implica movimento e comunicação e requer tempo, formação, inteligência, entranhas, mãos e coração. Tudo à imagem do «Bom Pastor» que propõe uma Igreja atenta a todos, focada no essencial, longe da lógica das estatísticas, sensível às periferias e às margens. Cabe aos pastores a responsabilidade primeira de fazer a Igreja transitar do ‘inverno’ para a ‘primavera’ da Missão.

Os bispos dizem que o «amor excessivo» de Deus por nós exige-nos uma dedicação radical ao seu anúncio. Nos tempos que correm, não bastam discursos, não basta reformar estruturas. É preciso ir mais longe e mais fundo e converter a nossa vida aos valores do Evangelho, sabendo que tal exige remar contra a corrente. Também não é suficiente a pastoral de manutenção do que já temos: é preciso partir em missão.
E vem sempre a propósito agarrar o que Bento XVI disse no Porto e também os bispos escreveram nesta carta: «Nada nos dispensa de ir ao encontro dos outros, pelo que temos de vencer a tentação de nos limitarmos ao que ainda temos, ou julgamos ter, de nosso e seguro […] tal seria morrer a prazo, enquanto presença da Igreja no mundo, que, aliás, só pode ser missionária.»
As Jornadas Missionárias Nacionais, de 17 a 19 de Setembro, em Fátima, vão aprofundar a relação entre o Espírito Santo e a Missão, provando que Ele é o protagonista dela. Desde há muitos anos que as JMN são o grande espaço de reflexão, de encontro e de partilha de quantos vibram com a Missão ad gentes em Portugal. A Carta Pastoral dos Bispos, que será distribuída a todos os participantes, é mais um incentivo a colocar a Missão no centro das (pre)ocupações da Igreja. Elas ajudarão, pela certa, a viver com intensidade o Outubro Missionário, evento que começa a ganhar direito de cidadania na Igreja em Portugal.

In: Contraponto
Setembro de 2010
Portugal com Missão
Por: TONY NEVES, Missionário Espiritano